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Autor: Ascom Adufg-Sindicato

Publicado em 23/08/2024 - Estadão, Na mídia

Em Águas Lindas de Goiás, Faculdade de Medicina consegue abrir curso sem aval do MEC

Instituição pertence à mesma família de outra escola que também inaugurou graduação por via judicial; alunos correm risco de perder disciplinas cursadas; faculdades afirmam ter gestões diferentes e culpam demora do governo, que diz seguir a fila

Em Águas Lindas de Goiás, Faculdade de Medicina consegue abrir curso sem aval do MEC
Alunos da UniMauá vivem apreensão sobre possibilidade de transferência de curso após graduação de Medicina da faculdade ter registro negado Foto: Wilton Junior/Estadão

Por Estadão

A Faculdade Mauá abriu o vestibular para um curso de Medicina em Águas Lindas de Goiás sem aval do Ministério da Educação (MEC). Isso foi possível graças a uma autorização judicial. A situação é similar à de outras oito instituições de ensino que recorreram à mesma medida, deixando os alunos diante da incerteza sobre se poderão concluir a graduação.

A liminar liberou o funcionamento do curso até que o MEC avalie o credenciamento do curso. No entanto, dias após o início das aulas, o MEC indeferiu o pedido da faculdade, que entrou com recurso.

A Faculdade Mauá de Goiás pertence à mesma família dona da UniMauá, com sede no Distrito Federal, que também já havia iniciado as aulas por meio de liminar. Semanas após a decisão judicial, porém, o ministério indeferiu o registro da UniMauá. Dessa forma, os alunos de Brasília continuam tendo aulas, mas o curso pode ser suspenso. A Faculdade Mauá de Goiás repete a estratégia. Procuradas, as faculdades dizem ter condições adequadas para oferecer o curso (leia mais abaixo).

A Mauá de Goiás tem como sócios Ciro Augusto Teles Lima e João Paulo Teles Lima. Já a UniMauá, do DF, tem como proprietária Dilcia Teles Lima e como gestor administrativo Ciro Augusto Teles Lima, segundo o site da própria faculdade. As duas graduações de Medicina também têm o mesmo professor na coordenação.

Em nota, a Mauá de Goiás afirma que, do ponto de vista jurídico, “não existe relação entre as faculdades”, com diferentes CNPJs e composições societárias. “Apesar dessas distinções, o fato de pertencerem à mesma família aproxima as IES (instituições de ensino superior)”, diz.

A instituição justificou a abertura sem autorização do MEC “porque a oferta é semestral e se o MEC demorar mais 30 dias” para dar a autorização “o semestre estará perdido”. Na época da abertura, a pasta não havia finalizado a análise do pedido.

Já a UniMauá, do DF, afirma que os dois cursos, apesar de pertencerem à mesma família, têm personalidades jurídicas diferentes e não compõem o mesmo grupo econômico.

O ministério, por sua vez, afirma que tem analisado os pedidos para abrir cursos por ordem de antiguidade (leia mais abaixo). Não existe um prazo para análise das solicitações.

Especialistas criticam a judicialização dos cursos de Medicina, uma vez que isso desorganiza a fila e eleva os riscos de graduações que não atendam a todos os critérios de qualidade necessários. Já as faculdades falam em demora do governo federal como justificativa para recorrer aos tribunais.

Vestibular com 120 vagas e descontos para 1ª turma

No vestibular da Facudade Mauá, foram ofertadas 120 vagas, com início das aulas no último dia 12. Assim como a Unimauá, do DF, a instituição dá desconto na mensalidade da turma estreante - o valor cai de R$ 10,5 mil para R$ 7 mil.

O pedido de abertura do curso da Faculdade Mauá de Goiás foi feito em 2022, mas foi concluído apenas em julho deste ano. Por isso, no início do ano, a instituição acionou a Justiça para que pudesse abrir o curso antes de o processo terminar.

Uma liminar de junho deu o direito para que a faculdade fizesse o vestibular e iniciasse as aulas. “A Faculdade MauáGO apresentou pedido ao MEC, atendeu a todos os requisitos legais e espera que o MEC cumpra seu papel regulador dentro da legalidade e autorize o curso”, continua a instituição.

Segundo a instituição, o curso de Medicina da Mauá de Goiás recebeu nota máxima em avaliação feita pelo MEC e teve recomendação do Conselho Nacional de Saúde sobre a necessidade social, já que Águas Lindas tem 0,77 médico por mil habitantes (dentro do limite fixado pelo MEC, de até 3,73 médicos por mil habitantes). Procurado, o ministério não informou o resultado dessa avaliação.

Quais são os critérios analisados pelo MEC?

O processo do curso de Medicina da Mauá passou em março para a fase de parecer final na avaliação do MEC, que consiste na verificação de alguns critérios, entre eles:

  • necessidade social do município onde o curso será aberto
  • existência de infraestrutura e serviços adequados e suficientes no SUS local
  • total de leitos, equipes de atenção primária, hospitais conveniados e programas de residência

Essas regras foram definidas pela portaria 531/2023, do MEC, e são aplicadas aos pedidos de abertura de cursos feitos entre 2018 e 2023, enquanto valia uma moratória que suspendeu novas graduações.

A Faculdade Mauá argumentou à Justiça que a demora do ministério em analisar o processo expõe uma “estratégia para evitar a finalização dos processos administrativos que envolvem autorização do curso de Medicina”.

O MEC, por sua vez, diz que todos os pedidos de novos cursos (ou para mais vagas nos cursos já existentes) estão sendo analisados por ordem de antiguidade. Segundo a pasta, o processo demora devido às diversas etapas de análise.

A pasta informou que chegou a receber 369 processos, sendo 335 de autorizações para novos cursos e 34 de aumento de vagas. Isso é próximo do total de cursos existentes (389). Se todos os pedidos fossem aprovados, o País teria 60 mil novas vagas de Medicina.

A pasta diz ter dividido as solicitações conforme as regras vigentes na época de cada uma delas. Isso torna o processo “altamente complexo do ponto de vista burocrático”, diz o ministério.

Das instituições que recorreram à via judicial, uma delas acabou ganhando aval do MEC: a Faculdade Santa Teresa, em Manaus. Já outras faculdades que abriram o curso por liminar tiveram, mais tarde, pedido de registro negado pelo ministério. É o caso não só da UniMauá, do DF, e da Faculdade Mauá de Goiás, como também do Centro Universitário Facens, de Sorocaba (SP).

O MEC diz que “tem adotado as medidas judiciais cabíveis para assegurar o reconhecimento da ilegalidade da oferta do curso e, com isso, interromper a continuidade do curso oferecido nesta condição”.

Em junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) ratificou a constitucionalidade da Lei dos Mais Médicos - que considera a demanda social e a estrutura de saúde pública da região - para a abrir novos cursos na área.