Notícias

Autor: Ascom Adufg-Sindicato

Publicado em 23/04/2024 - Estadão, Na mídia

Associações de faculdades e ensino a distância reagem a limite de EAD em licenciaturas: ‘Inviável’

Associações de faculdades e ensino a distância reagem a limite de EAD em licenciaturas: ‘Inviável’
Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Por Estadão

O Conselho Nacional da Educação (CNE) estabeleceu que os cursos de formação para professores, como Licenciaturas e Pedagogia, terão de ser oferecidos com 50% da sua carga horária presencial, conforme revelou o Estadão. O parecer ainda precisa ser homologado pelo ministro da Educação, Camilo Santana (PT), mas a reportagem apurou que a expectativa é de dar aval à nova definição.

A maior parte das associações de faculdades e de educação a distância (EAD) critica o teto de aulas a distância e aponta dificuldades para seguir o novo modelo. A adoção do ensino remoto para formar docentes no País tem crescido nos últimos anos e impulsionado a expansão do setor, que perdeu fôlego após a desidratação do Fies, programa federal de financiamento estudantil.

O avanço do EAD, porém, levanta questionamentos de especialistas sobre o nível da preparação dos futuros professores. Entre as críticas, está a falta de aulas práticas e de troca presencial de experiências com colegas e docentes durante a faculdade. Melhorar a qualidade dos educadores é crucial para alavancar os índices de aprendizagem do País, segundo especialistas.

Já o setor defende o ensino remoto alternativa para alunos mais pobres, que trabalham e têm menos tempo para se dedicar aos estudos. Aponta ainda a facilitação do acesso para quem mora fora dos grandes centros, como nas periferias, no interior e áreas rurais.

Santana já falou que a pasta estudava definir uma quantidade mínima de classes presenciais para as licenciaturas, e que queria acabar com a formação de docentes 100% EAD. Além disso, o ministro promete enviar ao Congresso uma proposta de criar uma espécie de agência reguladora do ensino superior privado, como forma de apertar a fiscalização sobre os cursos.

A Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed) protocolou esta semana carta ao ministro e ao CNE pedindo que a resolução seja revista. A entidade teme redução drástica “de professores formados no Brasil nos próximos anos”. Para o presidente da Abed, João Mattar, a educação a distância é essencial em regiões remotas e rurais, e para alunos pobres.

“50% é inviável do ponto de vista de logística porque os polos de atividades presenciais são pequenos, atendem poucos alunos”, afirma. O perfil dos estudantes - que trabalham e de origem mais vulnerável - também é apontado pela entidade como outro obstáculo.

Já a Associação Brasileira das Mantenedoras das Faculdades (Abrafi) diz compreender a posição do CNE como forma de dar resposta aos apelos sobre a qualidade do ensino a distância, mas critica a decisão por entender que pode “ferir a autonomia universitária, engessar alguns currículos e limitar a inserção de novas tecnologias dentro do processo ensino-aprendizagem”.

“A Abrafi sempre defendeu que o caminho fosse fortalecer a regulação através de uma avaliação mais eficaz nos polos EAD para ver se aquilo que está previsto dentro nos projetos pedagógicos dos cursos estão acontecendo, porque a Diretriz Curricular Nacional (DCN) que está em vigor já prevê uma quantidade de atividades de maneira presencial”, afirma a associação.

Hoje, 64% dos estudantes em Licenciaturas estão em cursos a distância e não há controle sobre o que é feito presencialmente. Parte das faculdades privadas oferece cursos em que os futuros professores estudam, muitas vezes, apenas por vídeos e apresentações em Power Point. As atividades presenciais, como provas, ocupam cerca de 10% do total.

“Será que esses polos e essas instituições estão trabalhando de fato conforme a previsão da DCN em vigência e dos seus próprios projetos pedagógicos? Porque pelo volume de denúncias, talvez esteja aí o grande problema”, completa.

Entenda

Cursos de licenciatura 100% a distância devem acabar, diz ministro da Educação

A Associação Nacional das Universidades Particulares (Anup), por sua vez, entende que as atividades práticas são mandatórias para a formação de professores, mas argumenta que as regras atuais já preveem patamares mínimos de aulas presenciais. “Sempre houve previsão de práticas em sala de aula para a formação de professores, desde o início das implementações curriculares”, diz.

A associação destaca ainda o potencial inclusivo da tecnologia na educação. “Vivemos em uma realidade em que a tecnologia tem produzido impactos positivos para a horizontalização do acesso à formação de novos profissionais, com aplicação de 20% até 40% de atividades já realizadas à distância”, diz.

Já a Associação Brasileira das Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) acredita que a discussão da formação docente deveria passar pelas metodologias de ensino e atividades necessárias para a formação, e não por um viés quantitativo, de percentual mínimo de carga presencial.

“O enfoque das contribuições da Abmes seguramente passarão pela convicção de que é importante que possamos discutir as metodologias que vão ser utilizadas nesses cursos de licenciaturas e quais são aqueles momentos de presencialidade que indiscutivelmente são necessários”, afirma.

O grupo educacional Yduqs, dono de faculdades como Estácio e Ibmec, diz que se for decidido pela mudança, “o impacto sobre as licenciaturas que ofertamos, se houver algum, não será significativo”.

Mais professores e mais EAD

A preocupação com a formação dos docentes se fundamenta em um aumento crescente da quantidade de estudantes de licenciatura, enquanto há redução das práticas presenciais. O Censo da Educação Superior de 2022, realizado pelo Ministério da Educação, mostra que as licenciaturas foram os que obtiveram maior aumento nos ingressos em 2022 em relação a 2021 - ualta anual de 30%, ante 18% do bacharelado e do tecnólogo.

Contudo, a pesquisa mostrou que a maior parte dos novos ingressantes entram em cursos a distância - são 64,2% no EAD, enquanto 35,8% no presencial.

A organização não governamental Todos Pela Educação critica o crescimento da formação de docentes de forma digital. “É claro que a educação a distância não é o único problema na formação inicial de professores, mas é inadmissível que o Brasil tenha na EAD a principal estratégia de formação inicial docente”, aponta, em nota, Priscila Cruz, presidente executiva da entidade.

“E isso se torna ainda mais grave na medida em que esse crescimento está atrelado à baixa qualidade. Ao seguir permitindo a proliferação de cursos que não preparam os estudantes para o início do exercício da docência, o País está, na prática, promovendo uma tremenda desvalorização da profissão docente”, continua.